 drum'n'bass com torresmo
Minas
Gerais, estado conhecido por suas violinhas e seu Clube da
Esquina tem gerado umas coisas muito improváveis. Um exemplo
disso é a cena de música eletrônica que está se formando
fortemente por aqui, e, mais específicamente o Anvil
FX, banda de drum’n’bass de primeira qualidade vindo
de Juiz de Fora. Banda é jeito de falar, já que o
Anvil FX é composto apenas por Paulo
Beto, que faz as programações, samples, etc... Quando
existem outros músicos, são apenas convidados. O
Anvil está lançando seu primeiro CD,
Lo-Fi Genesis, e tem feito vários
shows de divulgação do disco, como no Festival de Inverno de
Ouro Preto, para mais de 3000 pessoas numa praça pública.
Passado
Hoje em dia, com a
música eletrônica fazendo um grande barulho na mídia, várias
bandas estão acoplando "elementos eletrônicos" em seu som para
tentar um maior sucesso mercadológico. Sem dúvida este não é o
caso do Anvil FX. Paulo Beto é um dos
pioneiros da música eletrônica em Minas Gerais, há mais de 10
anos participando de várias bandas eletrônicas, industriais ou
experimentais, que era a música eletrônica que se fazia na
época. Um de seus projetos, o Primal
Violence, chegou a tocar no BHRIF (Festival de Rock
Independente produzido pela Prefeitura de Belo Horizonte em
94), e participa com uma música no CD Minimal
Synth Ethics II (Cri du Chat, 94). O
Silverblood, um projeto quase etéreo que
durou até 96, além de participação em coletâneas teve seu CD
Imperfection lançado também
pela Cri du Chat em 95.
O
Começo
O Anvil
FX em si começou como uma "evolução" do
Primal Violence, por volta de 95/96. Embora o
Primal fosse uma banda de tradição industrial, algumas coisas
foram sendo cada vez mais influenciadas pela "electronica" da
década de 90, chegando num ponto onde, na prática, não era
mais a mesma banda, e daí nasceu o Anvil FX.
Ser uma one-man-band não foi exatamente uma escolha dele:
"Não que eu quisesse trabalhar sozinho, mas não
tinha como não trabalhar sozinho morando em Juiz de
Fora". Sua
primeira demo tape,
Neuromoleculartv (Hipocampo,
96) é claramente influenciada por bandas como o
Autechre e Aphex Twin. Com o
tempo, Paulo foi se apoximando da música
negra e regional, gerando a demo
Maxpachxo (Hipocampo, 97), onde
seu drum’n’bass desconstruído convive pacificamente com música
regional brasileira, o que acabou virando marca registrada da
banda. Atualmente o som está menos caótico e mais dançante,
lembrando mais Roni Size do que
Autechre.
Lo-Fi
Genesis
Lo-fi Genesis é o primeiro
registro em CD do Anfil FX, lançado pela
gravadora mineira Motor Music. "Lo-fi", ou Low
Fidelity espelha o processo de produção do disco, sem
toneladas de produtores e pós-produções: "Eu gravei o disco todo
em casa, eu mesmo mixei, eu fiz tudo".
O disco é um
passeio pelo drum’n’bass atual, mas sem em momento algum se
prender apenas aos clichês do estilo. Cada faixa tem uma cara
própria. Uma pode ser um hardstep com influências
industriais, enquanto outra é uma bossa’n’bass com vocais em
português. Alias, uma das coisas mais legais do disco é
exatamente essa "brasilidade" que transparece quando se ouve
Lo-Fi Genesis: No meio da natucada
surge uma narração do milésimo gol do Pelé aqui, um sample
da Banda de Pífaros de
Caruaru ali e até uma música chamada
"Carnaval"... "Carnaval"
inclusive é a música mais pop do disco, com uma batida lenta,
com um doce vocal feminino por cima, e com certeza pode virar
uma porta de entrada do som do Anvil FX para
ouvidos menos formatados.
Musico
eletrônico
Embora hoje exista
a tendência de DJs fazerem música com vinis ou moleque usarem
computadores e programas para fazer seu som (obviamente não há
nada de errado com isso), O Anvil FX funciona
de outra forma: "Lo-fi é uma coisa que até certo limite
eu valorizo muito, porque hoje em dia com um computador, o
cara pode começar a instalar uma placa de musica e ali ele tem
todos os recursos [para se fazer música] mais mastigados. Eu
uso teclado, sampler, sintetizador, eu faço de um jeito mais
antigo... O computador existe para simular essas coisas que eu
já tenho então eu não vejo tanto sentido em me apoiar no
computador como a maioria das pessoas vêm
fazendo".
Onde o
Anvil FX se encaixa na cena?
Uma das propostas do trabalho do
Anvil FX é navegar na direção contrária à tendência fashion,
geralmente associada ao mundo da música eletrônica. Como ele
mesmo diz, "eu quero é que os cybermanos ouçam minha música".
Se por um lado Lo-Fi Genesis com certeza vai ser tocado para o
povo fashion, por outro lado ele também pode ser assimilado
pela geração pós-hip-hop: "Meu objetivo é fazer musica que
seja consumida no morro, o Drum’n’bass é uma evolução do
hip-hop, da cultura black... Eu quero estrar dentro desta
perspectiva, não de uma perspectiva clubber ou de uma
perspectiva moderna". Canções como "Carnaval" também podem ser
facilmente aceitas pelo grande público. Com todo o respeito,
nada que alguem que ouça Prodigy e, digamos, Pato Fu não
consiga assimilar.
Projetos
atuais
Além do Anvil FX em si, Paulo
Beto ainda tem vários outros projetos interessantes
na área da música eletrônica. Talvez o mais conhecido seja o
Belleatec, junto com a cantora
Tarsila Broder, que tem uma demo tape lançada
e chegou a abrir o show de BH da tour brasileira do
Atari Teenage Riot (aliás, diz a lenda que o
pessoal do Atari adorou o som). O estilo
praticado pela dupla é um tanto quanto difícil de ser
definido. Muito rápido, pesado e gritado, lembrando muito as
bandas da gravadora inglesa Digital Hardcore.
O
Freakplasma é outro projeto solo, mas desta
vez com uma sonoridade mais puxada para uma mistura de Big
Beats com Hip-Hop. Além disso, Paulo afirma
que, quando tiver tempo pretende criar um projeto – não
necessariamente dançante – apenas com samples de música das
décadas de 50 e 60.
Futuro
No futuro existe
uma grande chance do Anfil FX contar com um
baterista e um saxofonista no palco, além do próprio
Paulo Beto começar a tocar baixo elétrico.
"Isso não é
para deixar o show mais interessante, são misturas que eu
gosto que acho que tem a ver... Muitas pessoas se preocupam em
colocar elementos assim porque senão não vai ser show. Tem
trabalhos que são absolutamente áridos, desérticos, e é um
cara atras de um teclado fazendo uma coisa minimal, é a
proposta dele".
Atualmente ainda é difícil saber qual o futuro de um
artista de drum’n’bass no Brasil. Se por um lado nos parece
que está havendo uma abertura para a música eletrônica por
parte do grande público, por outro lado as mesmas coisas de
sempre continuam tocando nas rádios e nos programas de
televisão, de forma que é impossível prever como estará a cena
eletrônica no Brasil daqui a cinco anos. "Eu pretendo que continue
havendo uma evolução na minha carreira, lançar o máximo de
disco que eu conseguir".
Mas sabe-se que no
Brasil as coisas ainda são difíceis para um artista de música
eletrônica. Paulo Beto ressalta, por exemplo, o problema com
técnicos de som, que, por terem 15 anos de estrada, acham que
sabem tudo, porque já trabalharam com 200 bandas de rock, mas
na hora de trabalhar com uma banda eletrônica, simplesmente
não sabem como agir, chegando até a comprometer a qualidade da
aprensentação.
O público também
ainda não entende exatamente o que um músico que produz música
eletrônica faz, e não raro dá mais valor para um DJ que para a
pessoa que compõe a musica que o DJ vai tocar. "Você vai tocar ao vivo,
vai fazer uma seqüência de musicas suas, além de estar
manipulando as coisas mesmo... Aquilo pode ser ruim ou bom,
mas você está se esforçando para fazer uma coisa com nível.
Por outro lado é muito fácil você tirar onda de foda tocando
as melhores coisas dos outros... Tem um produtor que é foda no
Japão, aí você vai lá e pega uma musica dele, faz aquela
discotecagem do caralho, e não valoriza o brasileiro que está
insistindo em fazer música."
Além disso, outra
coisa que incomoda Paulo é a "mentalidade de
rock" que impera no Brasil, aquela onde o headliner de uma
noite obriga o técnico a abaixar o som das bandas que tocam
antes. "Eu
nunca vou querer que uma banda que toque antes de mim toque
mais baixo. O cara tem que se sobrepor pela qualidade do que
faz, não pelo volume. O som mudou, mas a mentalidade não mudou
ainda."
No entanto, com
mesmo todas essas dificuldades que ainda se passa, é inegável
que as coisas - para um artista de música eletrônica - tem
melhorado. O próprio lançamento de Lo-Fi
Genesis atesta isso, algo que seria
impossível há cinco anos atrás. Os espaços vão aparecendo aos
poucos, a mídia já se rendeu, e agora é esperar que artistas -
como o Anvil FX - comecem a aparecer e
desenvolver um trabalho sério, gerando uma cena forte, o que
será bom para todos. A música já mudou, agora mude a sua
mentalidade.
Pontos
altos de Lo-Fi Genesis: escute em real áudio
trecho das músicas
 |
Lo-Fi
Genesis |
Música que abre o disco, um drum'n'bass de pista
misturado a umas ambiências tensas a la Aphex Twin, gerando um
climão meio pesadelo...
 |
O Próximo
Segundo |
Um jazzy
drum'n'bass, bem ambiental, onde, em cima das bases, a cantora
Rena Engels repete ad infinitum o nome da
banda.
 |
Planet
Georgia |
Porrada feita sobre
medida para pistas do gênero. Rápida, pesada e com muitos, mas
muitos filtros passeando de um lado para outro.
 |
Caruaru
Elétrico |
Essa
música já valeria só pelo samplezinho de abertura (cortesia da
Banda de Pífaros de Caruaru), mas é muito mais que isso.
Realmente empolgante
 |
Carnaval |
Um susto
no meio do disco. Depois de tanto Drum'n'bass rápido eis que
surge uma quase Bossa Nova (modernizada, é claro), com vocal
feminino. Possivelmente o primeiro drum'n'bass romântico da
história.
Site Oficial Anvil FX - www.motormusic.com.br/anvilfx
Texto:
Danihell Albinati / Fotos:
Nino Andrés
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